Por Celso Araújo
Quando passei hoje pelo Museu Nacional, vi debaixo da escada que leva à grande galeria, crianças, mulheres, homens da etnia Yawalapiti. E ao lado deles o fotógrafo que realizou a façanha maior de registrar com uma poética original, na linha dos grandes fotógrafos de etnografia no mundo, o Olivier Boëls, francês residente no Brasil há mais de 15 anos.
Notava-se sua presença de guerreiro, exausto e atento e logo disse que o segundo grupo de mais de cinquenta pessoas que vieram do Xingu estava de luto, pois uma mulher havia morrido à noite na aldeia. Por essa razão, até o final da exposição não haverá mais danças e cantos, como os que aconteceram para um grande público nos primeiros dias da exposição aberta em 19 de abril.
O luto ali, na calçada, entre objetos artesanais de raríssima beleza, estava representado por um certo silêncio. Na galeria, as fotos de tirar o fôlego impressas em canvas: vida, trabalho, cotidiano, festa, afeto e mistérios de um povo. Muitos estudantes atentos às descrições do mediador Wala Yawalapiti, que falava com precisão de cada detalhe das fotos e do que representavam para sua gente.
Wala Yawalapiti, com uma concentração digna, explicava detalhes de cada pintura corporal, de cada artesanato, das habitações coletivas. Me disse depois que tudo o que quer é que os jovens brasileiros descubram a resistência de seu povo, que quase foi extinto ao longo da História não fosse a ação dos irmãos Villas Boas no Parque do Xingu. Para Wala, esses jovens que chegam espantados à galeria serão os futuros governantes de um país com o qual ele sonha tornar-se nação de todos.
Yawalapiti – Entre Tempos traz inclusive quatro painéis de tecelaria que levariam Athos Bulcão ao deslumbramento, tal a beleza das cores, da geometria singular. A exposição já foi visitada por mais de 20 mil pessoas, um recorde no sempre bem visitado Museu Nacional. É muito fácil saborear e aprender um pouco com essa exposição que traz as imagens, os corpos, as falas e artes do nosso povo magno.
Fim da tarde, recolhem-se as obras à venda a preços acessíveis, obras lindas para adorno, decoração e utilidades diversas. Estão lá, os lindos yawalapiti, o povo do tucum, a alma viva de sobreviventes de um possível ainda admirável mundo novo. Eles estão abrigados na Oca do Lago Norte. O fotógrafo Olivier e uma assistente vão levá-los para o lugar onde estão passando as noites. Parabéns, povo do Xingu, ameaçado sempre, mas até hoje a experiência mais digna de respeito aos humanos da Terra.
Celso Araújo é jornalista desde os meados da década de 1970 , trabalhou no Correio Braziliense, Jornal de Brasília, Rádio Nacional e atualmente integra a equipe da Rádio Cultura FM. Este é o último fim de semana para visitar a exposição ‘Yawalapiti – Entre Tempos’ no Museu da República. O fotógrafo Olivier Boëls espera conseguir patrocínio para levar a mostra para outras cidades do país e do mundo.
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